Muita gente me
pergunta a respeito da minha experiência na Palestina. Desde que
cheguei, tenho tido muitas dificuldades em falar sobre isso. Falar dos
Palestinos significa lembrar de pessoas que hoje são muito queridas
e que estão sofrendo pelo simples fato de existir. Quando me
propus a ir até lá, eu sabia que quase nada eu poderia fazer para
mudar os fatos, que a minha presença seria um mero paliativo; passar por esse processo, entretanto, é totalmente diferente de saber que isso
ocorreria.
Ler sobre a
Palestina se tornou quase uma tortura. Jornais e revistas retratam o
conflito de maneira totalmente equivocada. Primeiro, que eles mostram
correspondentes estacionados em Tel Aviv, falando com propriedade do
que se passa na Cisjordânia ou em Gaza1.
Acontece que, morando em Tel Aviv, eles provavelmente só escutam as
versões oficiais do governo israelense ou das organizações
israelenses, que são, na sua maioria, totalmente enviesadas, para
não dizer anti-palestinas. Seria o mesmo que colocar um repórter
fixo em Gaza. Além disso, estar em Tel Aviv significa que você não
tem qualquer contato com os territórios ocupados palestinos; existe
não só uma barreira física entre eles2,
como uma barreira psicológico. Só quem já foi à Palestina e a
Israel sabe do absurdo que é ter um correspondente internacional que
não transite entre as duas áreas.
Não sejam ingênuos
de pensar que eles mesmos não sabem disso. Se eles não o fazem, é
porque não querem mostrar a totalidade do conflito. Procure a
respeito da libertação do soldado israelense Gilad Shalit, que você
verá o nome dele estampado mil vezes, Enquanto os milhares de palestinos, inclusive crianças, que estavam e ainda estão em prisões israelenses, não tem nome algum. Isso porque eles cometeram crimes
bárbaros? 40% da população masculina palestina já passou pela cadeia ou segue encarcerada; nenhuma sociedade que possui um número tão
grande de criminosos. Os palestinos não são diferentes nem de nós, nem
dos israelenses3.
Eu conheço gente que foi presa por hastear a bandeira palestina em
cima de uma árvore; conheço até gente que foi presa e nem sabe o
porquê (nesse caso, conheço muita gente).
Esses repórteres
nunca conheceram (reparem que conhecer não significa ir lá pra
dizer foi) a Palestina. Não existe a possibilidade de qualquer ser
humano honesto ir à Palestina e retratar o conflito como uma guerra
entre iguais, como eles fazem. Aliás, retratar o conflito como se fosse entre iguais já seria um
avanço. Geralmente, esses repórteres tratam a questão como um conflito entre civilizados
e incivilizados, em um cenário onde eles, os palestinos, atacaram os israelenses e, então, estes fazem uso da força para se proteger. Os palestinos
lançam pedras e os israelenses se defendem com gás, armas, cães, bombas. Por que
será que os palestinos lançam pedras? São malucos? Por que eles simplesmente odeiam os
israelenses? Por que só os israelenses têm motivo para atacar?
Pensem nisso.
E qual é o meu
poder vendo todos esses absurdos? Nenhum. O máximo que eu posso
fazer é escrever nesse blog, esbravejar minha raiva e minha revolta
contra o Estado Israelense, contra a cobertura do conflito, etc... Que poder
tenho eu? O problema que essa limitação de poder se reflete nos
meus amigos que estão lá na Palestina, respirando gás lacrimogênio,
tendo suas terras confiscadas, suas casas derrubadas, seus entes
queridos presos, mortos. Assim a vida continuará, porque pessoas
como a Nathalia não tem poder nenhum. Resta rezar, para aqueles que
acreditam.
1Território
palestino ocupado
2Um
muro de 8 metros que não te deixa nem ver o outro lado
3Para
saber mais sobre os prisioneiros palestinos:
http://globalgeopolitics.net/wordpress/2011/04/26/every-fourth-palestinian-under-arrest/
; http://addameer.info/?p=493
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